A Revolução de 1930 foi
o movimento armado, liderado pelos estados de Minas Gerais, Paraíba e Rio
Grande do Sul, que culminou com o golpe de Estado, o Golpe de 1930,
que depôs o presidente da república Washington Luís, em 24 de
outubro de 1930, impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes e
pôs fim à República Velha.
Com a quebra da Bolsa de Nova Iorque, ocorrida em outubro
de 1929, iniciou-se uma crise econômica de escala mundial, esmagando todas as
economias com alguma participação nos mercados internacionais, caso do Brasil e
suas exportações de café. Em 1929, lideranças da oligarquia paulista romperam
a aliança com os mineiros, conhecida como política do café com leite,
e indicaram o paulista Júlio Prestes como candidato à presidência da República.
Em reação, o presidente de Minas Gerais, Antônio Carlos
Ribeiro de Andrada apoiou a candidatura oposicionista do gaúcho Getúlio
Vargas.
Em 1 de março de 1930, foram realizadas as eleições para
presidente da República que deram a vitória ao candidato governista, que era
o presidente do estado de São Paulo, Júlio Prestes. Porém, ele
não tomou posse, em virtude do golpe de estado desencadeado a 3 de outubro de
1930, e foi exilado. Getúlio Vargas assumiu a chefia do "Governo
Provisório" em 3 de novembro de 1930, data que marca o
fim da República Velha no Brasil.
Enquanto a Revolução de 1930 estava em andamento, Mário Pedrosa,
futuro crítico de arte, e Lívio Xavier, então militantes da Oposição de
Esquerda, dissidência do Partido Comunista do Brasil (PCB), escreveram
"Esboço de Análise da Situação Brasileira" e acabaram por lançar
algumas teses pioneiras sobre o movimento armado de outubro; entre elas, que se
tratava de uma cisão no bloco de poder ocasionada pelo desenvolvimento do
capitalismo.
A
Sucessão do Presidente Washington Luís
Na República Velha, (1889 - 1930), as eleições para
presidente da república ocorriam em 1 de março e a posse do presidente eleito
ocorria em 15 de novembro, regularmente, de quatro em quatro anos. Como não
existiam partidos políticos organizados, a nível nacional, na República
Velha, cabia, então, ao presidente da república a condução de sua sucessão,
conciliando os interesses dos partidos políticos de cada estado. A eleição para
escolha do sucessor do presidente Washington Luís, que governava desde 1926,
estava marcada para 1 de março de 1930. A posse do seu sucessor deveria ocorrer
em 15 de novembro de 1930.
Na República Velha vigorava a chamada "política do
café-com-leite", em que os presidentes dos estados de São
Paulo e de Minas Gerais, alternavam-se na presidência da república. Assim, de
acordo com esta "política do café-com-leite", Washington Luís deveria
indicar, para ser seu sucessor, o presidente de Minas Gerais, Antônio
Carlos Ribeiro de Andrada, ou o vice-presidente da República, que era o mineiro Fernando
de Melo Viana, que já fora presidente de Minas Gerais, ou outro líder político
mineiro. O nome do ex-presidente Artur Bernardes foi lembrado, mas não
era aceito por muitos, especialmente por Antônio Carlos. O nome de Melo Viana
foi vetado por Artur Bernardes e por Antônio Carlos.
Porém, no início de 1929, o presidente da República, Washington
Luís, fluminense, da cidade de Macaé e radicado em São Paulo
desde sua juventude, tendia a apoiar o presidente do Estado de São Paulo, Júlio
Prestes, que pertencia ao Partido Republicano Paulista, ao qual também
pertencia Washington Luís.
Em 29 de março de 1929, o jornal norte-americano The
New York Times informava que os cafeicultores de São Paulo dariam um
banquete a Júlio Prestes em Ribeirão Preto e o apoiariam para a
presidência, e esperavam o apoio dos demais estados produtores de café. O
jornal relatava ainda que Minas Gerais estava politicamente dividida.
O presidente de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada,
quebrando o compromisso assumido com Washington Luís de só tratar da questão
sucessória a partir de setembro de 1929, envia uma carta, datada de 20 de julho
de 1929, a Washington Luís, na qual indica Getúlio Vargas como o preferido para
candidato à presidência da república para o mandato de 1930 a 1934. Dizia
Antônio Carlos na carta: "Com o objetivo sincero de colaborar para
uma solução conciliatória e de justiça, julguei acertado orientar-me na direção
do nome do doutor Getúlio Vargas, por ser o de um político que se tem destacado
no apoio firme e na completa solidariedade à política e à administração de V.
Ex."
O termo "solução conciliatória" significa um candidato
não paulista e não mineiro, como havia ocorrido em 1918, com a escolha do
paraibano Epitácio Pessoa como candidato à presidência da República.
Washington Luís, então, devido ao lançamento da candidatura Getúlio feita por
Antônio Carlos, iniciou o processo sucessório consultando os presidentes dos
estados, (naquela época havia 20 estados no Brasil), e indicou o nome do
presidente do estado de São Paulo, Júlio Prestes de Albuquerque,
paulista, como o seu sucessor, no que foi apoiado pelos presidentes de
dezessete estados. Os três estados que negaram apoio a Júlio Prestes foram:
Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba.
Até hoje, lê-se na bandeira da Paraíba a palavra NEGO, (do
verbo "negar"), resposta dada pelo presidente da Paraíba, João
Pessoa, ao Presidente da República, Washington Luís, por telegrama, quando este
lhe solicitava apoio à candidatura de Júlio Prestes. Esse4 telegrama ficou
conhecido como o "Telegrama do Nego", datado de 29 de julho de
1929, nove dias após Antônio Carlos lançar Getúlio Vargas candidato à
presidência da república. No telegrama, João Pessoa, relatando a decisão tomada
pelo Partido Republicano Paraibano, dizia: "Reunido o diretório do
partido, sob minha presidência política, resolveu unanimemente não
apoiar a candidatura do eminente dr. Júlio Prestes à sucessão
presidencial da República".
Era comum, naquela época, as negociações políticas,
chamadas démarches, se fazerem, especialmente, através de longas
cartas. Washington Luís divulgou pela imprensa várias cartas que recebeu de
Getúlio Vargas e de Antônio Carlos de Andrada para provar que não impusera o
nome de Júlio Prestes como candidato à sua sucessão. Antônio Carlos chegou
a ser considerado pré-candidato à presidência da república, como mostra uma
marchinha da época, de autoria de Freire Júnior, cantada por Francisco de
Morais Alves e que se tornou uma profecia:
“Se o
mineiro lá de cima se descuidar,
Seu Julinho vem, vem, mas custa,
Muita gente há de chorar!”
Seu Julinho vem, vem, mas custa,
Muita gente há de chorar!”
Os políticos de Minas Gerais apoiadores da política
"carlista" ficaram insatisfeitos com a indicação de Júlio Prestes,
pois esperavam que Antônio Carlos, presidente do estado, fosse o indicado, por
Washington Luís, seguindo a tradição, ou, pelo menos, que o presidente
indicasse um terceiro nome, no caso, Getúlio Vargas. Os carlistas lançaram,
então, Getúlio como candidato de oposição à candidatura de Júlio Prestes.
Antônio Carlos ficaria conhecido como o "Arquiteto da Revolução de
1930".
Minas Gerais, então, se dividiu: Os políticos ligados ao vice-presidente
da república Melo Viana e ao ministro da Justiça Augusto
Viana do Castelo, pertencentes à Concentração Conservadora, mantiveram o apoio
a Júlio Prestes e fizeram oposição à política carlista e ao Partido
Republicano Mineiro.
Com a indicação de Júlio Prestes como candidato oficial à
presidência da república e o consequente apoio do PRM de Minas Gerais
à candidatura de Getúlio Vargas, terminava a política do café-com-leite,
que vigorou na República Velha, quebrando o equilíbrio político nacional criado
por Campos Sales na sua chamada Política dos Estados que
ficaria conhecida popularmente como "política dos governadores" e
jogando o Brasil numa instabilidade política.
O perigo da instabilidade política já chamava, em 1929, a
atenção de Monteiro Lobato, na época representante comercial do Brasil
nos Estados Unidos. Em 28 de agosto de 1929, em carta ao dr. Júlio
Prestes, Monteiro Lobato transmite-lhe votos pela "vitória na
campanha em perspectiva", afirmando que "sua política na
presidência significará o que de mais precisa o Brasil: continuidade
administrativa!"
Os três estados dissidentes, iniciaram a articulação de uma
frente ampla de oposição, chamada de Aliança Liberal, que tinha o objetivo
de se opor ao intento do presidente da república e dos dezessete estados de
eleger Júlio Prestes. Washington Luís era, por natureza, um conciliador, (por
exemplo, assim que assumiu a presidência, libertou todos os presos políticos,
civis e militares), porém, em outubro de 1929, três meses depois da indicação
de Júlio Prestes, ocorreu a queda dos preços do café, em decorrência
da crise de 1929. Isto fez com que Washington Luís mantivesse a
candidatura de um paulista, Júlio Prestes, oficializada em 12 de outubro, como
queriam os cafeicultores de São Paulo, apesar das pressões de Minas Gerais,
Paraíba e do Rio Grande do Sul. Por seu lado, Antônio Carlos não aceitou
retirar a candidatura Getúlio.
Júlio Prestes se destacara no governo de São Paulo pela defesa
do café. Entre outras medidas tomadas reformou o Banespa, para ser um
banco de hipotecas dos estoques de café, harmonizando os interesses
dos cafeicultores com os dos exportadores de Santos. O café representava
70% das exportações brasileiras. Além disso, havia uma superprodução de café
nas fazendas e um grande estoque nas mãos do governo paulista. Pela lógica,
Minas Gerais, como segundo maior produtor de café do Brasil, deveria apoiar São
Paulo, mas terminou por apoiar o Rio Grande do Sul.
A Aliança
Liberal e Tenentismo
A Aliança Liberal foi criada em agosto de 1929 para
fazer oposição à candidatura de Júlio Prestes à presidência da
república. Formavam a Aliança Liberal: Minas Gerais, Rio Grande do Sul e
Paraíba e partidos políticos de oposição de diversos estados, inclusive
do Partido Democrático (1930) de São Paulo.
O Partido Democrático surgiu, em 1926, de uma dissidência
do PRP, o partido de Júlio Prestes e Washington Luís. Sendo que um dos
líderes do Partido Democrático, (Paulo Nogueira Filho), participou do
"Congresso Libertador", realizado em Bagé, em 1928. Em
contrapartida, em Minas Gerais, a aliança política denominada Concentração
Conservadora apoiou Júlio Prestes.
No dia 5 de agosto, os líderes das bancadas mineira e gaúcha na
Câmara dos Deputados declaram que não faziam mais parte da maioria parlamentar
governista.
A formalização da Aliança Liberal foi feita em 20 de setembro de
1929, numa convenção dos estados e partidos oposicionistas, no Rio de Janeiro,
presidida por Antônio Carlos de Andrada, lançando os candidatos da Aliança
Liberal às eleições presidenciais: Getúlio Vargas para presidente da República
e João Pessoa, presidente da Paraíba, para a vice-presidência da
República. Washington Luís tentou convencer os presidentes gaúcho e mineiro de
desistirem dessa iniciativa. Em carta dirigida a Andrada, argumentava que
dezessete estados apoiavam a candidatura oficial. Não obteve êxito.
Em 12 de outubro de 1929, realizou-se, no Rio de Janeiro, uma
convenção dos 17 estados governistas, que indicou Júlio Prestes de Albuquerque
como candidato à presidência da República e o presidente da Bahia, Vital
Soares, pertencente ao Partido Republicano Baiano, a vice-presidente.
Getúlio Vargas enviou o senador Firmino Paim Filho para
dialogar em seu nome com Washington Luís e Júlio Prestes. Em dezembro de 1929,
formalizou-se um acordo, no qual Getúlio Vargas comprometia-se a aceitar os
resultados das eleições e, em caso de derrota da Aliança Liberal, se
comprometia a apoiar Júlio Prestes. Em troca, Washington Luís comprometia-se a
não ajudar a oposição gaúcha a Getúlio, a qual praticamente não existia, pois
Getúlio unira o Rio Grande do Sul.
No dia 2 de janeiro de 1930, Getúlio Vargas lê, na Esplanada do
Castelo, no Rio de Janeiro, a Plataforma da Aliança Liberal,
tratando dos principais problemas brasileiros, na qual, destaca as questões
sociais: "Não se pode negar a existência da Questão Social no
Brasil como um dos problemas que terão de ser encarados com seriedade pelos
poderes públicos. O pouco que possuímos em matéria de legislação social não é
aplicada ou só o é em parte mínima, esporadicamente, apesar dos compromissos
que assumimos a respeito, como signatários do Tratado de Versalhes".
E criticou a política de valorização do café que vinha sendo
feita até então: "A valorização do café, como se fazia, teve
tríplice efeito negativo: diminuiu o consumo, fez surgir sucedâneos e
intensificou a concorrência, que, se era precária antes do plano brasileiro,
este a converteu em opulenta fonte de ganho. Foram, com efeito, os produtores
estrangeiros e não os nossos, paradoxalmente, os beneficiários da valorização
que aqui se pôs em prática".
A Aliança Liberal teve o apoio de intelectuais como José
Américo de Almeida, João Neves da Fontoura, Lindolfo Collor, Virgílio
Alvim de Melo Franco, Afrânio de Melo Franco, Júlio de Mesquita Filho, Plínio
Barreto e Pedro Ernesto, de membros das camadas médias urbanas, na
época chamadas de "classes liberais" que se opunham às "classes
conservadoras" formada pelas associações comerciais e fazendeiros. No Rio
Grande do Sul, o grande articulador da Aliança Liberal foi Osvaldo Aranha.
A Aliança Liberal contou com o apoio, também, da corrente
político-militar chamada "Tenentismo". Destacavam-se, entre os tenentes: Cordeiro
de Farias, Newton de Andrade Cavalcanti, Eduardo Gomes, Antônio
de Siqueira Campos, João Alberto Lins de Barros, Juarez Távora, Luís
Carlos Prestes, Bertoldo Klinger, João Cabanas, Newton Estillac
Leal, Filinto Müller e os três tenentes conhecidos como os
"tenentes de Juarez": Juracy Magalhães, Agildo Barata e Jurandir
Bizarria Mamede. E ainda na marinha do Brasil: Ernâni do Amaral
Peixoto, Ari Parreiras, Augusto do Amaral Peixoto, Protógenes
Pereira Guimarães. E o general reformado Isidoro
Dias Lopes, o general honorário do exército brasileiro José Antônio Flores da Cunha e o major da Polícia
Militar de São Paulo, Miguel Costa. O tenente Cordeiro de Farias, que chegou a marechal, afirmou, em
suas memórias, que os tenentes estavam em minoria no exército brasileiro em
1930, mas que mesmo assim fizeram a revolução de 1930.
Os objetivos e os ideais da Aliança Liberal
podem ser sintetizados pela frase do presidente de Minas Gerais, Antônio
Carlos, que afirmava, ainda em 1929, em um discurso interpretado como um
presságio e uma demonstração do instinto de sobrevivência de um político
experiente, ao implantar, em Belo Horizonte, pela primeira vez no Brasil, o voto secreto: "Façamos serenamente a revolução, antes
que o povo a faça pela violência".
A Eleição de 1º de março de 1930
A Aliança Liberal entrou na disputa eleitoral sabendo, de
antemão, que seria dificílima a vitória, tendo apoio de apenas 3 estados. Uma
marchinha da época mostra a certeza da vitória que tinham os apoiadores de
Júlio Prestes:
“
|
Paraibano
com gaúcho e com mineiro,
Diz o Julinho, É sopa, é sopa, é sopa! |
”
|
A campanha eleitoral, no entanto, ocorreu relativamente calma,
dentro dos padrões de violência da República Velha. O episódio mais grave da
campanha eleitoral foi o "Atentado de Montes Claros",
quando, poucos dias antes da eleição de 1 de março, no dia 6 de fevereiro, uma
passeata de adeptos de Júlio Prestes (chamados de prestistas) foi dissolvida a
tiros de revólver e de carabina por elementos aliancistas daquela
cidade. Os tiros partiram da residência do líder aliancista João Alves, quando
a caravana prestista passava em frente à sua residência. O ministro da Justiça
Viana do Castelo reportou 5 mortos e 14 feridos. Alguns dos feridos morreram
alguns dias depois. Saiu ferido, entre outros, o sr. vice-presidente da
república Fernando de Melo Viana, que levou três tiros no pescoço. Seu
secretário particular, Dr. Rafael Fleury da Rocha, morreu no local.
Porém, o presidente Antônio Carlos, em sua mensagem de governo
de 1930 ao Congresso Estadual de Minas Gerais, na qual classificou o
"Atentado de Montes Claros" como tendo sido um
"morticínio", dá outra versão ao ocorrido, afirmando que prestistas e
carlistas se encontraram frente a frente numa rua da cidade de Montes Claros,
iniciando-se, então, um tiroteio. Aconteceram outros dois casos, também graves,
de ataques entre aliancistas e partidários de Júlio Prestes:
O primeiro ocorreu em 26 de dezembro de 1929, na Câmara dos
Deputados: Depois de um comício nas escadarias do Palácio Tiradentes, o
deputado federal prestista Manuel Francisco de Sousa Filho, de Pernambuco,
foi assassinado, a tiros de revólver, no interior da Câmara dos Deputados, pelo
deputado aliancista Ildefonso Simões Lopes, do Rio Grande do Sul. Na
versão dos aliancistas, o deputado Idelfonso Simões Lopes teria agido em
legítima defesa.
O segundo, em 20 de fevereiro, em Chapecó, na fronteira
entre Santa Catarina, prestista, e o Rio Grande do Sul, houve troca de
tiros entre as polícias dos dois estados. No dia seguinte, casas de
prestistas foram atacadas a tiros em Riacho dos Machados.
Em 23 de fevereiro de 1930, em um comício do Partido
Democrático, na Vila Guilherme em São Paulo, um delegado de
polícia é morto a tiros de revólver.
A eleição para a presidência da república foi realizada no dia 1
de março de 1930, um sábado de carnaval, e foi vencida por Júlio Prestes,
(chamado, pela imprensa de "Candidato Nacional") com 1.091.709 votos
contra 742.797 dados a Getúlio (Candidato Liberal). Getúlio, no entanto,
obteve 100% dos votos do Rio Grande do Sul e um total de 610.000 votos nos três
estados aliancistas. A votação de Getúlio nos 17 estados prestistas foi
inexpressiva. No antigo Distrito Federal, a cidade do Rio de Janeiro,
houve empate. O Rio Grande do Sul acabou sendo o único estado aliancista que
chegou unido às eleições de 1 de março. Júlio Prestes foi eleito para governar
de 1930 a 1934. Sua posse na presidência deveria ocorrer no dia 15 de novembro
de 1930. A apuração dos resultados da eleição foi demorada e tensa, se
estendendo até maio de 1930.
Em 19 de março é quebrada a unidade da Aliança Liberal, pois,
numa surpreendente declaração aos jornais, o líder gaúcho Borges de Medeiros
reconhece a vitória de Júlio Prestes, alegando que fraude houve de ambos os
lados: "Fraude houve de norte a sul, inclusive aqui mesmo". O
termo "aqui mesmo" se refere ao Rio Grande do Sul. Os líderes
liberais se apressaram a desautorizar Borges de Medeiros. Sendo que o caso mais
grave, durante a apuração dos votos, ocorreu em Belo Horizonte:
Em 3 de abril, no centro daquela cidade, partidários de Antônio
Carlos foram dispersados a tiros por prestistas, havendo vários feridos. O
episódio ficou conhecido como o "Atentado da Rua Espírito Santo". Os
tiros partiram da residência do líder prestista, Manuel Tomás de Carvalho
Brito, que fora uma das vítimas do "Atentado de Montes Claros".
Porém, na sua versão, apresentada ao governo federal, Carvalho de Brito garante
que sua casa é que foi alvejada por carlistas, no que foi desmentido por
Antônio Carlos em sua mensagem de governo de 1930. Durante semanas, o clima
ficou tenso em Belo Horizonte, esperando-se um contra-ataque dos carlistas.
Tropas federais estacionadas em Ouro Preto seguiram para Belo
Horizonte para garantirem a segurança pública.
Em 22 de maio de 1930, o Congresso Nacional proclama eleitos
para a presidência e vice-presidência da república, Júlio Prestes e Vital
Soares. Em seguida à proclamação final dos resultados, o presidente eleito
Júlio Prestes viajou para os Estados Unidos, sendo recebido como
presidente eleito pelo presidente dos Estados Unidos Herbert Hoover.
Em Washington, declara que o Brasil nunca será uma ditadura e
se torna o primeiro brasileiro a sair na capa da revista Time.
Júlio Prestes só retornou a São Paulo em 6 de agosto, sendo recebido por uma
multidão de adeptos, na atual Estação da Luz.
Houve acusações de fraude eleitoral, de ambas as
partes, como sempre houve, em todas as eleições brasileiras desde o Império
do Brasil. A Aliança Liberal recusou-se a aceitar o resultado das urnas. A
Aliança Liberal denunciou que os deputados e senadores, eleitos em 1 de março
de 1930, não obtiveram o reconhecimento dos mandatos na Comissão de Verificação
de Poderes do Congresso Nacional do Brasil.
Os partidários de Washington Luís e Júlio Prestes se defendiam,
dizendo que houve apenas um caso: a Paraíba, onde houve duplicidade de atas
eleitorais, o que sempre ocorrera na República Velha. Em Minas Gerais não houve
a diplomação dos eleitos. Os prestistas também desconfiavam do grande número de
eleitores alistados no Rio Grande do Sul. Suspeitava-se que cidadãos uruguaios tinham
sido alistados para votarem no Rio Grande do Sul.
A Paraíba
Conflagrada – A República de Princesa
A Aliança Liberal também acusava Washington Luís de estar por
trás de uma revolução, liderada por um coronel do sertão, o
senhor José Pereira Lima, desafeto de João Pessoa. Revolução está de caráter
estadual, ocorrida na cidade de Princesa Isabel, na Paraíba, iniciada em
15 de março, e que visava derrubar o presidente da Paraíba João Pessoa.
O governo federal recusou-se a decretar a intervenção federal na
Paraíba. O episódio ficou conhecido como a "República de Princesa",
que só foi dominada pelo governo da Paraíba em agosto de 1930. O combate à
"República de Princesa" foi liderado por José Américo de Almeida, e
encerrado quando as tropas de José Pereira entregaram suas armas ao Exército
Brasileiro em 19 de agosto de 1930. A "República de
Princesa" foi a última revolução de âmbito estadual da República Velha.
A
Conspiração
A partir da recusa da maioria dos políticos e tenentes da
Aliança Liberal de aceitar o resultado das urnas, iniciou-se uma conspiração,
com base no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais, com a intenção de não permitir
que Júlio Prestes assumisse a presidência, o que deveria ocorrer em 15 de
novembro. No nordeste do Brasil, o tenente Juarez Távora, que havia fugido
da prisão em janeiro de 1930, organizava, na clandestinidade, a revolução.
Esta conspiração sofreu um revés em 10 de maio, quando morreu,
em acidente aéreo, o tenente Antônio Siqueira Campos. Siqueira Campos
era um bom articulador político e fazia o contato com militares estacionados em
São Paulo. Com sua morte, praticamente acabou o ímpeto revolucionário entre
militares estacionados em São Paulo. Em 29 de maio de 1930, a conspiração
sofreu outro revés, com o brado comunista de Luís Carlos Prestes, que
deveria ter sido o comandante militar da revolução de 1930, mas desistiu do
comando para apoiar o comunismo. O comandante militar secreto da
revolução ficou sendo então o tenente-coronel Pedro Aurélio de Góis
Monteiro. Em 1 de junho, Getúlio lança um manifesto acusando irregularidades
nas eleições de 1 de março, porém não clama por revolução, assim como em sua
última mensagem anual, como presidente do Rio Grande do Sul, ao poder
legislativo gaúcho.
Em 18 de julho, foi destruído (na época se dizia empastelado)
o jornal prestista e da Concentração Conservadora Folha da Noite,
em Belo Horizonte, por um grupo de aliancistas que chamavam o presidente de
Minas Gerais Antônio Carlos de covarde, e que pediam abertamente a
revolução. Começava, então, a concretizar-se o temor de Antônio Carlos, de
que haveria uma revolução violenta que fugiria ao controle dos políticos da
Aliança Liberal.
O
Assassinato de João Pessoa
No dia 26 de julho de 1930, João Pessoa, então presidente
da Paraíba, foi assassinado por João Duarte Dantas, em Recife,
por questões de ordem pessoal. João Duarte Dantas, cuja família era inimiga
política de João Pessoa, tivera o escritório de advocacia saqueado. Havia
sido arrombado, no escritório de João Dantas, o cofre onde se encontravam
cartas e poemas de amor da escritora Anayde Beiriz, que foram divulgados e
considerados escabrosos. Alguns livros de história afirmam que a
correspondência foi publicada no jornal oficial do governo estadual, A
União. Outros dizem que as cartas apenas circularam de mão em mão. De
qualquer forma, tornaram-se públicas. Foi um escândalo.
No dia 26 de julho, quando João Pessoa estava com
amigos na Confeitaria Glória, em Recife, João Dantas vingou-se:
acompanhado de um cunhado, disparou dois tiros contra o peito do presidente da
Paraíba, dizendo: "Sou João Dantas, a quem tanto humilhaste e
maltrataste". João Duarte Dantas foi preso e levado para a Casa
de Detenção do Recife, onde foi espancado e morto. João Dantas dissera que
matara João Pessoa para defender sua honra. Oficialmente, suicidou-se. Anayde
foi encontrada morta em 22 de outubro, por envenenamento, em Recife. Outro
suposto suicídio.
Apesar de totalmente desvinculado da eleição de Júlio Prestes, o
episódio do assassinato de João Pessoa foi o estopim que deflagrou a
mobilização armada dos partidários de Getúlio e da Aliança Liberal. O corpo de
João Pessoa foi embarcado em um navio, no Recife, em 31 de julho de 1930, para
ser enterrado, em 18 de agosto, no Rio de Janeiro. Tanto em Recife, como no Rio
de Janeiro, houve missas solenes e discursos inflamados, colocando a culpa no
governo de Washington Luís pela morte de João Pessoa. No Recife ocorreu um
enorme tiroteio. O Largo de São Francisco, em São Paulo, foi palco de um
conflito de estudantes no dia 17 de agosto, quando homenageavam João Pessoa;
houve tiros, um morto e vinte feridos, com intervenção da polícia e do
exército.
O Presidente da República não se defendia das acusações.
Washington Luís fora avisado, repetidas vezes pelos seus assessores, de que
havia um movimento subversivo em marcha visando derrubá-lo do poder. Washington
Luís, porém, não tomou nenhuma medida preventiva para impedir a revolução.
O
Problema da Sucessão Presidencial
Na República Velha (1889-1930), vigorava no Brasil a
chamada política do café com leite, em que políticos apoiados
por São Paulo e de Minas Gerais se alternavam na
presidência da república (mas não eram necessariamente paulistas ou mineiros os
seus indicados). Porém, no começo de 1929, o então presidente da
república Washington Luís indicou o nome do presidente de
São Paulo, Júlio Prestes como seu sucessor, no que foi apoiado por
presidentes de dezessete estados. Apenas três estados negaram o apoio a
Prestes: Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba. Os políticos
de Minas Gerais esperavam que Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, o
então presidente do estado, fosse o indicado por Washington
Luís, para ser o candidato à presidência.
Assim a política do café com leite chegou ao
fim e iniciou-se a articulação de uma frente oposicionista ao intento do
presidente e dos dezessete estados de eleger Júlio Prestes. Minas Gerais, Rio
Grande do Sul e Paraíba uniram-se a políticos de oposição de diversos estados,
inclusive do Partido Democrático de São Paulo, para se oporem à candidatura de
Júlio Prestes, formando, em agosto de 1929, a Aliança Liberal.
Em 20 de setembro do mesmo ano, foram lançados os
candidatos da Aliança Liberal às eleições presidenciais: Getúlio Vargas como
candidato a presidente e João Pessoa, como candidato a vice-presidente.
Apoiaram a Aliança Liberal, intelectuais como José Américo de Almeida e Lindolfo
Collor, membros das camadas médias urbanas e a corrente político-militar
chamada Tenentismo (que organizou, entre outras, a Revolta
Paulista de 1924), na qual se destacavam Cordeiro de Farias, Eduardo
Gomes, Siqueira Campos, João Alberto Lins de Barros, Juarez
Távora e Miguel Costa e Juracy Magalhães e três futuros
ditadores (Geisel, Médici e Castelo Branco).
Nesse momento, setembro de 1929, já era percebido em São Paulo
que a Aliança Liberal, e uma eventual revolução, colocava-se contra o estado de
São Paulo. Tendo o senador estadual de São Paulo Cândido Nanzianzeno
Nogueira da Motta denunciando a iminência da revolução, na tribuna
do Senado do Congresso Legislativo do Estado de São Paulo, em 24 de
setembro de 1929, que:
“
|
A
guerra anunciada pela chamada Aliança Liberal não é contra o sr. Júlio
Prestes, É contra nosso Estado de São Paulo, e isso não é de hoje. A
imperecível inveja contra o nosso deslumbrante progresso que deveria ser
motivo de orgulho para todo o Brasil. Em vez de nos agradecerem e apertarem
em fraternos amplexos, nos cobrem de injúrias e nos ameaçam com ponta de
lanças e patas de cavalo!
|
”
|
|
|
|
Cândido Mota citou ainda o senador fluminense Irineu
Machado que previra a reação de São Paulo:
“
|
A
reação contra a candidatura do Dr. Júlio Prestes representa não um gesto
contra o presidente do estado, mas uma reação contra São Paulo, que se
levantará porque isto significa um gesto de legítima defesa de seus próprios
interesses"!
|
”
|
Essa resposta paulista à revolução de 1930 veio um ano e meio
depois, com a Revolução de 1932.
O presidente de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de
Andrada diz em discurso, ainda em 1929:
“
|
Façamos
a revolução pelo voto antes que o povo a faça pela violência
|
”
|
Esta frase foi vista como a expressão do instinto de
sobrevivência de um político experiente e um presságio: Minas Gerais, se
aliando ao Rio Grande do Sul e aos tenentes, consegue preservar sua oligarquia.
Uma revolução que fosse feita só pelos tenentes teria derrubado também o PRM (Partido
Republicano Mineiro) do poder em Minas Gerais e o PRR do poder no Rio Grande do
Sul.
3 de
outubro de 1930
Em 7 de setembro de 1930, o
movimento revolucionário tem um novo impulso. Neste dia, Antônio Carlos passa o
governo de Minas Gerais a Olegário Maciel, sendo que este era muito mais decidido a fazer uma
revolução do que Antônio Carlos. O Presidente Olegário foi o único presidente
de estado a continuar no cargo após a revolução de 1930.
Sobre o sigilo da conspiração, Getúlio contou à Revista
do Globo, edição especial de agosto de 1950, que sua filha Alzira só soube
da revolução 2 dias antes dela ter início e afirmou: "Em 1930,
preparando a Revolução, fui obrigado a fazer um jogo duplo: de dia mantinha a
ordem para o governo federal e à noite introduzia os conspiradores no Palácio (Piratini)".
Em 25 de setembro de 1930, foi determinado, pelo comando revolucionário, que a
revolução começaria em 3 de outubro, as 17:00 horas. O início da revolução já
havia sido adiado várias vezes, devido às hesitações e indecisões dos
revolucionários.
Desta vez não houve adiamentos. Em 3 de outubro de 1930, no
período da tarde, em Porto Alegre, iniciou-se a Revolução de 1930, com a
tomada do quartel-general da 3ª Região Militar. Ataque a este comandado
por Osvaldo Aranha e Flores da Cunha. Neste ataque aconteceram
as primeiras mortes da revolução de 1930.
Um fato demonstra a importância que Getúlio Vargas dava à
Revolução: neste dia 3 de outubro, precisamente, ele começou a escrever o diário,
o qual encerrou em 1942. No início do diário, Getúlio registra que o comandante
da 3ª Região Militar, General Gil Dias de Almeida, pouco antes de ter seu
quartel-general atacado, disse a Getúlio que queimaria sua biblioteca se
Minas Gerais entrasse em um processo revolucionário. Washington Luís também
jamais conseguiu acreditar que Minas Gerais fizesse uma revolução. Na abertura
do Diário, meia hora antes do início da revolução, Getúlio refletiu
sobre sua responsabilidade na revolução e um eventual fracasso desta:
“
|
Quatro
e meia. A hora se aproxima. Examino-me e sinto-me com o espírito tranquilo de
quem joga um lance decisivo porque não encontrou outra saída. A minha vida
não me interessa e sim a responsabilidade de um ato que decide o destino da
coletividade. Mas esta queria a luta, pelo menos nos seus elementos mais
sadios, vigorosos e altivos. Não terei depois uma grande decepção? Como se
torna revolucionário um governo cuja função é manter a lei e a ordem? E se
perdermos? Eu serei depois apontado como o responsável, por despeito, por
ambição, quem sabe? Sinto que só o sacrifício da vida poderá
resgatar o erro de um fracasso.
|
”
|
Em caso de fracasso da revolução, Getúlio, como um dos
"cabeças" da revolução, pelas leis da época, estava sujeito a pena de
até 20 anos de prisão e à pena de banimento. O antigo código penal
brasileiro, baixado pelo decreto nº 847, 11 de outubro de 1890,
previa: "Artigo 107: Tentar diretamente e por fatos, mudar por
meios violentos a Constituição política da República ou a forma de governo
estabelecida. Pena: de banimento aos 'cabeças'; e aos corréus a reclusão por 5
a 10 anos". A lei nº 1.062 de 29 de setembro de 1903,
aplicava, aos "cabeças", a pena de reclusão de 10 a 20 anos. O crime
era inafiançável.
No Nordeste do Brasil, devido a um erro de interpretação
das ordens dadas pelo comando revolucionário, a revolução só começou na
madrugada de 4 de outubro. A revolução se alastrou por todo o país. As tropas
gaúchas marcharam rumo a São Paulo, porém sem derrubar o governo catarinense,
pois só conseguiram tomar a Ilha de Santa Catarina no dia 16. No dia
6 de outubro, o The New York Times noticiava que 80.000 homens
estavam na luta. Em Minas Gerais, inesperadamente, houve resistência, pois,
o 12º Regimento de Infantaria de Belo Horizonte não aceitou o golpe.
Oito governos estaduais, no nordeste do Brasil, na época chamada
de Norte, foram depostos pelos tenentes, sendo que os tenentes
enfrentaram, na Bahia e em Pernambuco, resistência notável. Os
revolucionários derrubaram o governo de Pernambuco em 8 de outubro, depois de
um combate que resultou em 150 mortos.
No dia 10, Getúlio Vargas partiu, por ferrovia, rumo ao Rio
de Janeiro, capital federal na época, deixando o governo do Rio Grande do Sul
com Osvaldo Aranha e não ao vice-presidente gaúcho João Neves da Fontoura, fato
que levou João Neves renunciar ao seu cargo de vice-presidente gaúcho.
Em meados de outubro, a revolução dominava apenas parte do
nordeste do Brasil e parte do Sul do Brasil. Mantinham-se leais ao governo
federal, os estados de Santa Catarina, Bahia, São Paulo, Rio
de Janeiro e o Distrito Federal (Rio de Janeiro), toda a região norte
do Brasil: Amazonas, Pará e o Território do Acre, e todo
o Centro Oeste: Goiás e Mato Grosso. O governo de Santa
Catarina foi derrubado em 16 de outubro, e os demais citados somente com o fim
da revolução. Barbosa Lima Sobrinho narra, em seu livro A
Verdade sobre a Revolução de 1930, a ocupação do estado do Espírito
Santo pelas tropas mineiras. O governo capixaba foi deposto em 16 de
outubro de 1930.
No Nordeste do Brasil, os revolucionários marchavam em
direção à Bahia. Pelo sul, os revolucionários, vindos do Rio Grande do Sul,
estavam estacionados na região de Itararé, na divisa do Paraná com
São Paulo, onde as forças do governo federal e tropas paulistas estavam
acampadas para deter o avanço das tropas revolucionárias.
Esperava-se que ocorresse uma grande batalha em Itararé. Getúlio
aguardava os acontecimentos, instalado em Curitiba. No Sul de Minas
Gerais tropas federais ainda resistiam ao avanço das tropas mineiras rumo
ao Rio de Janeiro. Não houve a esperada "Batalha de Itararé", porque,
em 24 de outubro, antes que ela ocorresse, os generais Tasso Fragoso e Mena
Barreto e o almirante Isaías de Noronha depuseram
Washington Luís através de um golpe militar, e formaram uma Junta
Militar Provisória. No mesmo dia, Osvaldo Aranha foi enviado ao Rio de Janeiro
para negociar a entrega do poder a Getúlio Vargas. A Junta Militar governou o
Brasil até passar o governo a Getúlio em 3 de novembro de 1930. Washington Luís
foi deposto apenas 22 dias antes do término do mandato presidencial, que se
encerraria em 15 de novembro de 1930.
Jornais que apoiavam o governo deposto foram destruídos (na
época, se dizia: empastelados), entre eles jornais influentes,
como O Paiz, A Noite, Correio Paulistano, órgão oficial
do Partido Republicano Paulista, A Plateia, Gazeta de
Notícias, A Crítica e a Folha da Manhã, atual Folha
de S. Paulo. O edifício-sede de O Paiz foi totalmente
incendiado. As polícias do Rio de Janeiro, então capital federal, e de São
Paulo se omitiram e nada fizeram para impedir os atos de vandalismo. Na cidade
de São Paulo, as bancas do jogo do bicho foram atacadas por serem
suspeitas de financiarem o PRP e o governo paulista deposto.
Washington Luís, Júlio Prestes e vários outros próceres
políticos da República Velha, como Manuel Tomás Carvalho de Brito, José Maria
Belo, Átila Neves, Irineu Machado, Otávio Mangabeira, Melo
Viana, Antônio Prado Júnior, entre outros, foram presos e exilados.
Washington Luís só retornou ao Brasil em 1947, depois da deposição de Getúlio
Vargas, em 1945.
Getúlio, depois de uma passagem por São Paulo, onde ocupou
o Palácio dos Campos Elísios, sede do governo paulista deposto, rumou para
o Rio de Janeiro. Foi uma cena que os paulistas não esqueceriam: Soldados
mineiros e gaúchos, com fuzis nos ombros, montando guarda para Getúlio na sede
do governo paulista. Getúlio chegou ao Rio de Janeiro, de trem, em 31 de
outubro de 1930. Inteirou-se da situação política no Rio de Janeiro, para só
depois assumir o governo.
A derrocada de Washington Luís e Júlio Prestes foi cantada
assim, por Alvinho e a Orquestra Copacabana, com a marchinha de Osvaldo
Santiago "Bico de Lacre Não Vem Mais": "Quem
disse que um dia ele ia lá no Catete se assentar, dê a mão a palmatória. Não
vem mais 'Seu Julinho' porque o povo não quis, 'Bico de Lacre' coitadinho, como
tu fostes infeliz... 'O Cavanhaque' deu o fora, deixou 'Seu Julinho' na mão, e
este assim desempregado há de tomar um bom pimpão". "Bico de
Lacre" era apelido de Júlio Prestes dado por José Carlos de Macedo
Soares.
Uma República
Nova
Às 15 horas do dia 1 de novembro de 1930, a junta militar passou
o poder, no Palácio do Catete, a Getúlio Vargas, encerrando a
chamada República Velha, derrubando todas as oligarquias estaduais exceto
a mineira e a gaúcha.
Na mesma hora, no Rio de Janeiro, os soldados gaúchos cumpriam a
promessa de amarrar os cavalos no obelisco da Avenida Rio Branco,
marcando simbolicamente o triunfo da Revolução de 1930.
Getúlio Vargas tornou-se chefe do Governo Provisório com amplos
poderes. A constituição de 1891 foi revogada e Getúlio passou a governar
por decretos. Getúlio nomeou interventores para todos os Governos Estaduais,
com exceção de Minas Gerais. Esses interventores eram na maioria tenentes que
participaram da Revolução de 1930.
Por sua vez, o presidente eleito e não empossado Júlio Prestes
criticou duramente a Revolução de 1930 quando, em 1931, exilado em Portugal,
afirmou:
“
|
O
que não compreendem é que uma nação, como o Brasil, após mais de um século de
vida constitucional e liberalismo retrogradasse para uma ditadura sem
freios e sem limites como essa que nos degrada e enxovalha perante o mundo
civilizado!
|
”
|
Um dos maiores erros da revolução de 1930 foi entregar os
estados à administração de tenentes inexperientes, um dos motivos da revolução
de 1932. O despreparo dos tenentes para governar foi denunciado, logo no início
de 1932, por um dos principais tenentes, o tenente João Cabanas, que havia
participado da revolução de 1924, e que usou como exemplo o tenente João
Alberto Lins de Barros que governou São Paulo. João Cabanas, em fevereiro
de 1932, no seu livro "Fariseus da Revolução", criticou especialmente
o descalabro que foram as administrações dos tenentes nos estados, chamando a
atenção para a grave situação paulista pouco antes de eclodir a Revolução de
1932:
“
|
João
Alberto serve como exemplo: Se, como militar, merece respeito, como homem
público não faz jus ao menor elogio. Colocado, por inexplicáveis manobras e
por circunstâncias ainda não esclarecidas, na chefia do mais importante
estado do Brasil, revelou-se de uma extraordinária, de uma admirável
incompetência, criando, em um só ano de governo, um dos mais trágicos confucionismos
de que há memória na vida política do Brasil, dando também origem a um grave
impasse econômico (déficit de 100.000 contos), e a mais profunda
impopularidade contra a "Revolução de Outubro".. e ter
provocado no povo paulista, um estado de alma equívoco e perigoso. Nossa
história não registra outro período de fracasso tão completo como o do
"Tenentismo inexperiente"!
”
|
Consequências
Os efeitos da Revolução não demoram a aparecer. Ainda em novembro
é criado o Ministério do Trabalho, da Indústria e do Comércio afirmando o
caráter trabalhista no planejamento político de Vargas, que governava por
decretos. A nova Constituição só é aprovada em 1934, a
chamada Constituição de 1934, depois de forte pressão armada e social
da Revolução Constitucionalista de 1932. A estrutura do Estado brasileiro
modifica-se profundamente depois de 1930, se reajustando a novas necessidades
econômicas e sociais, as quais o governo julgava imprescindíveis.
Getúlio, três anos e meio depois, decreta uma nova constituição,
a Constituição de 1937, que instaurava o Estado Novo, em uma suposta
tentativa de travar a radicalização da revolução por meio de comunistas
denunciados pelo Plano Cohen.
E assim se posicionou em relação a Constituição de 1934, no 10º
aniversário da revolução de 1930, em discurso de 11 de novembro de 1940:
“
|
Uma
constitucionalização apressada, fora de tempo, apresentada como panaceia de
todos os males, traduziu-se numa organização política feita ao sabor de
influências pessoais e partidarismo faccioso, divorciada das realidades
existentes. Repetia os erros da Constituição de 1891 e agravava-os
com dispositivos de pura invenção jurídica, alguns retrógrados e outros
acenando a ideologias exóticas. Os acontecimentos incumbiram-se de
atestar-lhe a precoce inadaptação!
|
”
|
A partir da constituição de 1937, o regime centralizador, por
vezes autoritário do getulismo, ou Era Vargas, estimula a expansão das
atividades urbanas e desloca o eixo produtivo da agricultura para
a indústria, estabelecendo as bases da moderna economia brasileira.
O balanço da revolução de 1930 e de seus 15 anos de governo, por
Getúlio, foi feito, no Dia do Trabalho de 1945, em um discurso feito no Rio de
Janeiro, no qual disse:
“
|
A
qualquer observador de bom senso não escapa a evidência do progresso que
alcançamos no curto prazo de 15 anos. Éramos, antes de 1930, um país fraco,
dividido, ameaçado na sua unidade, retardado cultural e economicamente, e
somos hoje uma nação forte e respeitada, desfrutando de crédito e tratada de
igual para igual no concerto das potências mundiais!
|
”
|
Legado Político
Três ex-ministros de Getúlio Vargas chegaram à Presidência
da República: Eurico Dutra, João Goulart e Tancredo Neves.
Este último não chegou a assumir o cargo, pois, na véspera da posse, sentiu
fortes dores abdominais sequenciais durante uma cerimônia religiosa no
Santuário Dom Bosco, recebendo o diagnóstico de diverticulite que o
levou à morte em 21 de abril de 1985, em São Paulo.
Três tenentes de 1930 chegaram à Presidência da República: Castelo
Branco, Médici e Geisel.
O ex-tenente Juarez Távora foi o segundo colocado nas
eleições presidenciais de 1955, e o ex-tenente Eduardo Gomes, o
segundo colocado, em 1945 e 1950. Ambos foram candidatos pela UDN, o que
mostra também a influência dos ex-tenentes na UDN, partido que tinha ainda,
entre seus líderes, o ex-tenente Juraci Magalhães, que quase foi candidato
em 1960.
Os partidos fundados por Getúlio Vargas, PSD (partido
dos ex-interventores no Estado Novo e intervencionista na economia) e
o antigo PTB, dominaram a cena política de 1946 até 1964.
PSD, UDN e PTB, os maiores partidos políticos daquele período,
eram liderados por mineiros (PSD e UDN) e por gaúchos (o PTB).
Apesar de quinze anos (1930-1945) não serem um período longo em
se tratando de carreira política, poucos políticos da República Velha conseguiram
retomar suas carreiras políticas depois da queda de Getúlio em 1945. A
renovação do quadro político foi quase total, tanto de pessoas quanto da
maneira de se fazer política.
Sobre a queda da qualidade da representação política após 1930,
Gilberto Amado em seu livro "Presença na Política", explica:
“
|
Na
República Velha, as eleições eram falsas, mas a representação era verdadeira…
As eleições não prestavam, mas os deputados e senadores eram os melhores que
podíamos ter!
|
”
|
Getúlio foi o primeiro a
fazer no Brasil propaganda pessoal em larga escala, com a Voz do Brasil. A
aliança elite-proletariado, criada por Getúlio, tornou-se típica no Brasil,
como a Aliança PTB-PSD apoiada pelo clandestino PCB.
Legado Econômico
A política trabalhista é alvo de polêmicas até hoje e foi
tachada de "paternalista" por intelectuais de esquerda. Esses
intelectuais acusavam Getúlio de tentar anular a influência desta esquerda
sobre o proletariado, desejando transformar a classe operária num setor
sob seu controle, nos moldes da Carta do Trabalho do fascista italiano Benito
Mussolini.
Os defensores de Getúlio Vargas contra-argumentam, dizendo que
em nenhum outro momento da história do Brasil houve avanços
comparáveis nos direitos dos trabalhadores. Os expoentes máximos
dessa posição foram João Goulart e Leonel Brizola. Brizola foi
considerado, por muitos estudiosos, como último herdeiro político do
"Getulismo", ou da "Era Vargas", na linguagem dos
brasilianistas.
A crítica de direita, ou liberal, argumenta que, a
longo prazo, estas leis trabalhistas prejudicam os trabalhadores porque aumentam
o chamado custo Brasil, onerando muito as empresas e
gerando a inflação, que corrói o valor real dos salários.
Segundo esta versão, o custo Brasil faz com que as empresas
brasileiras contratem menos trabalhadores, aumentem a informalidade e
faz que as empresas estrangeiras se tornem receosas de investir no Brasil.
Assim, segundo a crítica liberal, as leis trabalhistas gerariam, além da
inflação, mais desemprego e subemprego entre os
trabalhadores.
Os liberais afirmam também que intervencionismo estatal na economia iniciado
por Getúlio só cresceu com o passar dos anos, com a única exceção de Castelo
Branco atingindo seu máximo no governo do ex-tenente de 1930 Ernesto
Geisel. Somente a partir do Governo de Fernando Collor se começou a
fazer o desmonte do Estado intervencionista. Durante sessenta anos, após 1930,
todos os ministros da área econômica do governo federal foram
favoráveis a intervenção do Estado na economia, exceto Eugênio
Gudin por sete meses em 1954, e a dupla Roberto Campos - Octávio
Bulhões, por menos de três anos (1964 -1967).
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