sábado, 26 de março de 2011

COQUETEL DE PIMENTA NO DOS OUTROS É REFRESCO

A população adulta do bairro de Cruz das Armas entre as décadas de 1950 a 1970, era formada pelas populações das fases adulta madura e adulta velha, (considerando as três fases com as quais a medicina divide as faixas etárias adultas da vida humana, a saber: fase adulta jovem, dos 18 aos 40 anos; fase adulta madura, dos 40 aos 60 anos, (fase popularmente conhecida por meia idade); fase adulta velha, acima dos 60 anos, (fase popularmente conhecida como terceira idade)).

A grande maioria dessa população era egressa de cidades muito pequenas, ou povoados rurais dessas mesmas cidades, tanto do interior do estado da Paraíba, como do interior dos estados vizinhos de Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. Esse êxodo ocorria por motivo das secas periódicas nordestinas e por falta de trabalho nessas pequenas cidades interioranas.

Portanto o bairro herdou essa população imigrante, por ser na época um bairro em expansão e também formado por um grande plantel de pessoas rudes, de pouquíssima escolaridade e por isso desconheciam as leis que estabeleciam seus direitos e deveres, razão pela qual muitos exageros eram cometidos nos relacionamentos humanos dentro e fora de casa.

Dentre esses exageros reportaremos um ato de “santa ignorância” de uma mãe de família super estressada com seus mais de oito filhos pequenos, entre cinco e treze anos de idade, nos quais ela batia exageradamente todos os dias da semana.

Curiosamente esses espancamentos eram feitos na frente da sua casa, onde todos viam e se chocavam com as cenas de violência com que essas surras, por motivos banais, eram praticadas, num verdadeiro crime de tortura que, caso fosse praticado na época de hoje, ela e os espectadores estariam todos comprometidos, conforme a Lei nº 9455, de 07/04/97, que “define e pune o crime de tortura, como crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia, por ele respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evita-lo, se omitirem”.

Num certo dia correu um comentário de que um de seus filhos havia sido visto num beco com as calças abaixadas e um outro moleque por traz dele, ambos tentando subir em um pé de jenipapo. Ora, naquela época a garotada andava sempre com um calção de elástico como única indumentária, sem camisa e sem qualquer outra peça por baixo do calção. Além do que, ante qualquer esforço, esse calção tendia a baixar um pouco, tanto porque o elástico ia, com o tempo, perdendo sua elasticidade, como porque os meninos daquela época eram meninos magros, de pouca massa muscular, ou pelo próprio biótipo, ou pelo mal passadio.

Não estava existindo nada mais do que uma tentativa de subirem ambos e ao mesmo tempo na árvore, mas os fofoqueiros de plantão que vivem para infernizar a vida dos outros, inventando histórias só para ver o circo pegar fogo, levaram a informação para a mãe torturadora de que os meninos estavam praticando um ato sexual, quando nem idade para isso tinham, pois eram muito tenros e ainda não despertos de suas sexualidades. E mesmo que fosse, nada justificaria tamanha brutalidade.

Nesse dia foi grande o alvoroço na rua. A torturadora amarrou o menino despido na frente da casa, dando-lhe porradas e dizendo que ia aplicar um clister no menino para ele acabar  com o “fogo no rabo” e nunca mais querer saber de dar o “fundo” .

Enquanto a criança amarrada feito um bode, gritava pedindo socorro e dizendo que nada do que disseram era verdade, a mãe esmagava pimentas de todos os tipos e colocava o sumo em uma garrafa. Ajudada pelos outros filhos, colocaram o menino de cabeça para baixo e ela aplicava o sumo ardente no anus da criança que já não mais chorava e sim, uivava feito um lobo doente, numa cena de violência tão chocante que todos os que a presenciaram ainda guardam-na indelével em suas memórias até os dias de hoje e não a deletarão de tão infame que fora.  

Desse dia em diante o rosto desse garoto assumiu uma conotação estranha, distante, de tristeza profunda. Ele não falava mais com ninguém e nem brincava mais com os outros garotos. Sua infância deixou de existir e o seu semblante já não era mais o de uma criança. Ele ficou sério como um adulto. Sua vida se resumiu de sua casa para a escola.

Voltou-se para os estudos como a única porta de saída daquele inferno em que vivia e todos aprenderam a respeitá-lo e admira-lo, pois entendiam que ele havia sido vítima de uma calúnia como as outras calunias que vitimaram seus irmãos e saciaram os olhos sádicos dos caluniadores ante o espetáculo de tortura em público promovido pela sua mãe.

Mas que importância teria para quem quer que seja o fato dele ser homossexual ou não? Por que ele teria que ser espancado em público por causa disso? E o que é pior, por que ele teria que ser espancado em público só porque alguém pensou que ele era homossexual?

O fato é que o pobre garoto se isolou do mundo, se agarrou aos livros, encontrou a porta e por ela saiu daquele submundo que o maltratava sem motivos e foi para um mundo diferente e nele constituiu uma família e nela constrói o amor que ele não teve.

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