domingo, 13 de fevereiro de 2011

A História de Dona Dalina

Dona Dalina era uma senhora branca, afilada, muito magra, muito alta e bastante autoritária. Falava alto e andava sempre de cabeça erguida, a passos largos como um soldado alemão e exatamente no meio da rua, quando se dirigia à bodega de Seu Antonio Magro, percurso repetido umas seis vezes ao dia, acompanhada sempre de Nega, uma moleca de uns cinco anos que ela criava e que fora tomada, a força, por ela, dos braços de uma esmolada alcoólatra na feira de Oitizeiro, numa ocasião em que a bêbada maltratava a guria, que nem sequer andava ainda.
Dona Dalina era temida por todos os seus circunstantes, filhos, esposo ou vizinhos. Se ofendida com alguma "indireta", não limitava as palavras ásperas e ofensivas, aos gritos, com o dedo em riste, quase no nariz do ofensor, que, quase sempre, ficava calado, se esquivava e ia embora.
Seu Pedro, seu esposo, era o contrário de Dona Dalina. Tinha uma estatura a baixo da média, era de cor preta, falava pouco e manso e andava muito devagar. Quando largava do serviço de garí da Prefeitura, gostava de parar, antes de chegar em casa, na bodega de Seu Antonio Gordo, para tomar umas pingas, sem ser visto pela mulher, talvez, que só frequentava a bodega do outro Antonio, defronte, e ele só ia para casa ao anoitecer, com os passos trôpegos e nos lábios um sorriso bobo, constante e indiferente as esculhambações de Dona Dalina.
Seu Pedro, infelizmente, teve um final trágico, pois de tanta cachaça e outras carencias, ficou, como se dizia na época, "abilolado" pelas ruas, repetindo constantemente um jargão adotado na campanha de Pedro Gondim a governador do estado da Paraíba que era "o home é Pedo" "o home é Pedo" "o home é Pedo".
Com a saúde abalada, Seu Pedro fora aposentado pela PMJP e ficou perambulando pelas ruas, repetindo o jargão de campanha de Pedro Gondim. Nesse ínterim, apareceram umas moças evangélicas, Testemunhas de Jeová, que andavam, vestidas a rigor, pregando e angariando adéptos à religião nova e, à época, desconhecida de muitos.
Essas moças conseguiram convencer Seu Pedro a se tornar uma Testemunha de Jeová, que, sem que Dona Dalina soubesse, se reunia com as moças nos cultos realizados nas casas dos novos adéptos, exceto, é claro, na sua própria casa, pois Dona Dalina não sabia e nem poderia saber, dessa sua adesão.
Um certo dia Seu Pedro, de tão fraco e debilitado veio, sem maiores trabalhos, a falecer em seu próprio leito, durante a noite, amanhecendo o dia morto.
Dona Dalina tomou todas as providencias necessárias, ou seja, chamou a SANDÚ para atestar o óbito, conseguiu um caixão doado pela Prefeitura Municipal e colocou o féretro na sala, arrodeado de velas acesas. Inesperadamente, adentram-se à sala, as moças Testemunhas de Jeová, todas vestidas com saias longas, cinzas e blusas brancas de mangas compridas, ensacadas às saias e os cabelos longos amarrados ao estilo totó.
Dona Dalina olhou espantada e firme àquele adentramento, mas permaneceu calada, fixando-as firmimente com com os olhos. De repente uma das moças pergunta: "quem é a esposa dele?" e Dona Dalina respode: "sou eu, por que?" e a moça responde: "é para a Senhora tirar as velas do caixão dele".
Dona Dalina:
"Tirar as velas? Por que? Por que eu tenho que tirar as velas do caixão dele?"
A moça:
"Porque ele é Testemunha de Jeová".
Dona Dalina:
"E Jeová não manda aqui não. Quem manda aqui sou. Tá ouvindo? Quem manda aqui sou eu, não é Jeová não".
E as moças, assustadas e tristes, saíram daquela presença que tanto assustara o pobre de Seu Pedro na vida e na morte.

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